terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Greve Geral paralisa a Nigéria

Por Américo Gomes 

A Nigéria parou neste início de 2012, com uma Greve Geral contra a eliminação do subsídio de combustível, no dia 1° de janeiro.

Este ato do governo levou o preço do litro da gasolina de $ 0,40 de dólar para $ 0,86. Outras nações produtoras de petróleo como a Venezuela, Kuwait e Arábia Saudita oferecem a sua população combustível por cerca de $ 0.12 de dólar o galão, que tem em média 3,7 litros. (Nada a ver com o valor no Brasil de $ 1,40 dólar o litro)

Este aumento leva a patamares insuportáveis o preço dos transportes e alimentação para a maioria da população.

O presidente Goodluck Jonathan disse que o subsídio era economicamente insustentável, mas o que é insustentável é a maioria dos nigerianos viverem com menos de 1,3 dólares por dia, ou seja, 2 reais.

Lojas, escritórios, escolas e postos de gasolina em todo o país fecharam desde o primeiro dia desta Greve que os sindicatos dizem que vai continuar por tempo indeterminado.

Na cidade portuária Lagos, com mais de 10 milhões de pessoas, 500 mil se reuniram no Parque Gawi Fawehinmi. Em Kano, manifestantes bloquearam as estradas principais, fecharam postos de gasolina e cercaram a casa do chefe do banco central de Nigéria. Renomearam a praça principal da cidade de "Liberation Square," inspirando-se a revolução egípcia e na Tahrir Square.

As forças de segurança responderam aos protestos com violência. Em Kano, a polícia disparou e pelo menos três manifestantes morreram e pelo menos 30 ficaram feridos. Outro manifestante morreu em um confronto com a polícia em Lagos. O governo impôs um toque de recolher noturno, mas a população não acatou.

O momento do corte seria o mais inadequado para o governo que leva uma luta contra militantes islâmicos da organização Boko Haram, no norte do país. No que ele anuncia como um conflito pior do que a guerra civil que viveu o país na década de 1960, com os separatistas da República de Biafra.

Então por que fazê-lo agora?

País do Petróleo

A BP afirmou que a África detém 127 bilhões de barris de petróleo inexplorados, quase dez por cento das reservas mundiais. A Nigéria é o maior exportador de petróleo da África. A Agência Internacional de Energia diz que a Nigéria detém 37 bilhões de barris de reservas, superando a Noruega.

O governo anunciou com orgulho que o país hoje produz diariamente 2,4 milhões de barris. O Standard Bank estima que a Nigéria tem feito US$ 6 trilhões de dólares em receita do petróleo nos últimos 50 anos.

Mas apesar de ser um grande produtor de petróleo a Nigéria não tem investido na infra-estrutura necessária para produzir combustível refinado, então tem que importar grande parte de sua gasolina. Apesar de sua riqueza petrolífera, importa 85% do seu próprio combustível.

A partir daí o corte dos subsídios atinge o custo dos alimentos, e as necessidades básicas da vida, tais como aluguéis, mensalidades escolares e contas médicas.

Outra característica do país é que é considerado um dos mais corruptos do mundo. Desde a independência da Grã-Bretanha em 1960, cerca de US$ 400 bilhões das receitas do petróleo estão desaparecidos, presumivelmente roubados, pela elite militar e política.

Mesmo o salto repentino dos preços do petróleo causado pela Primeira Guerra do Golfo em 1990 e 1991, foi desperdiçado pela junta militar que governava o país e roubou uma “catarata de petróleo” que significou a entrada de $ 12,5 bilhões de dólares em receitas. Desviando bilhões dólares para contas privadas ou despesas clandestinas.

Lagos tem uma das maiores concentrações de bilionários da África. Enquanto a taxa de desemprego é de 47%, e a água potável é um luxo para cerca de 80% de sua população.

Multinacionais no comando

As exportações de petróleo e gás representam mais de 98% das receitas de exportação e cerca de 83% das receitas do governo federal. Os Estados Unidos é o maior importador de petróleo bruto da Nigéria, representando 40% do total das exportações.

Quase todas as reservas estão concentradas em torno do delta do rio Níger. O petróleo foi perfurado comercialmente em Oloibiri neste delta, em 1956, pela Shell gigante anglo-holandesa do petróleo.

A Shell admitiu ter derramando 14 mil toneladas de petróleo bruto nos córregos do delta do Níger, em 2009, destruindo parte das comunidades pesqueiras na região do sudeste da Nigéria e as zonas úmidas, no mais devastador derramamento de petróleo do mundo, que passava despercebido, com décadas de danos ao meio ambiente.

O delta do Niger é habitado por inúmeros grupos étnicos, e quase toda a região militarizada com a existência também de grupos de milícias, em constante conflito.

Atualmente quase toda a produção e exploração de petróleo realizada sob Joint Ventures entre corporações multinacionais estrangeiras e o governo federal através da Nigerian National Petroleum Corporation.

Há seis terminais de petróleo de exportação no país, todos estão nas mãos das multinacionais, a Shell possui dois. A Shell é responsável por 50% da produção total de petróleo do país, com mais de oitenta campos de petróleo. A Exxon-Mobil, é o segundo maior produtor, a Chevron a terceira, depois estão empresas como a Agip italiana, ConocoPhillips e a Total francesa.


Estas multinacionais ganham com a exportação e depois com a importação, pois a gasolina refinada vem de refinarias da Costa do Marfim, controladas pela Total francesa e da Holanda e Inglaterra, controladas pela Shell.

A mão do FMI

A hora do corte dos subsídios pode ter sido imprópria, mas a ordem veio diretamente do o recém nomeado diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde, que ordenou que os governos da Nigéria, Guiné, Camarões, Gana e Chade deveriam abrir mão dos subsídios aos combustíveis em seus países.

Com isso os preços dos transportes praticamente triplicaram nestes países, sem aviso prévio.

Esta foi uma exigência do Fundo antes de dar mais empréstimos do Banco Mundial, procedimento normal, já que sempre determina que os países mutuários devam seguir estritamente as políticas econômicas ditadas por ele, que incluem: desvalorização da moeda, elevação de tarifas de comércio, eliminação de subsídios e cortes no orçamento prejudicial à saúde do sector público e serviços de educação.

Junto com isso se concentrarem na produção e exportação de commodities e recursos para aumentar o câmbio. Com isso a inflação e a pobreza crescem na mesma proporção como visto em uma grande parte de países ao redor do mundo.

Como tantas outras nações, o povo nigeriano ter visto seu padrão de vida sistematicamente reduzido após serem submetidos a políticas estruturais de ajustamento do FMI. Desta vez o Fundo também exigiu a criação de um Fundo de Riqueza Soberana, similar ao criado pelo governo brasileiro.

Do outro lado o Departamento de Estado dos Estados Unidos, estão realizando exercícios militares com o AFRICOM, com cenário de guerra baseado na necessidade de assumir o controle do delta do Níger, em um contexto da “desintegração” da Nigéria à beira do colapso e em meio à guerra civil.

Seguindo os passos de Hillary Clinton, que em 2009, realizou reuniões com autoridades nigerianas para discutir novas medidas de segurança conjunta para o delta do Níger.

Além de controlar o delta, o governo dos EUA está estabelecendo uma "guerra ao terror" no norte do país contra o Boko Haram, para isso já enviou em novembro passado, 100 homens das Forças Especiais para trabalhar com os militares nigerianos. Ainda que não esteja claro que Boko Haram seja uma ameaça nas proporções que se anuncia.

As ações dos governos, das multinacionais e dos bancos internacionais demonstram quem de fato esta no comando na África e na Nigéria e o avanço no processo de recolonização.

Greve continua

A central sindical, Nigéria Labour Congress, estabeleceu um hiato nas manifestações neste fim de semana, para permitir que a população estocasse alimentos, gasolina e outros viveres. Anunciando que a greve continuaria na segunda-feira, 16 de janeiro.

Agora os sindicatos se preparavam para parar o “coração pulsante da economia” a produção de petróleo. O objetivo é parar da produção em todo o delta sul da Nigéria. Se os campos forem desligados, podem demorar seis meses a um ano para serem reiniciados.

A Associação do Pessoal Senior da Nigéria do Petróleo e Gás Natural, que representa cerca de 20.000 trabalhadores, disse que seria forçada a "aplicar uma opção amarga" com o encerramento da produção de petróleo e gás, se o governo recusar a repor os subsídios da gasolina.

A ameaça de uma greve causa nervosismo nos mercados mundiais de petróleo. A Nigéria é o quinto maior fornecedor de petróleo para os EUA e uma paralisação forçaria refinarias americanas a substituir 630 mil barris por dia de petróleo bruto.

Há informes também que como a Greve tem proporcionado a unidade entre a classe trabalhadora e os pobres nigerianos, a violência sectária tem sido condenada por muçulmanos e cristãos. Durante o primeiro dia da greve, os cristãos foram proteger os muçulmanos enquanto rezavam, e os muçulmanos se ofereceram para defender igrejas cristãs.

Esta Greve Geral na Nigéria é importantíssima, pois se trata do país mais populoso da África, com mais de 160 milhões de pessoas, quase o dobro de qualquer outro país no continente, e a segunda maior economia da África subsaariana. Coloca a classe trabalhadora e o operariado no centro de um dos maiores conflitos e um dos países mais importantes do continente.

Somente se a classe operária tomar os destinos de seus pais em suas mãos poderá acabar com séculos de exploração colonial feito pelas multinacionais e bancos dos países imperialistas.

Um ótimo exemplo a ser seguindo no restante da África e no Oriente Médio.


*Américo Gomes, advogado com especialização em Política e Relações Internacionais, membro do ILAESE e assessor do Sindipetro de Alagoas e Sergipe.

Fonte: Sítio do PSTU

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