domingo, 22 de janeiro de 2012

Apesar de ordem de suspensão, PM mantém operação de despejo


Juíza não reconhece decisão do Tribunal Regional Federal

Apesar do Tribunal Regional Federal ter determinado a suspensão imediata da ordem de reintegração de posse do Pinheirinho, o Comando da Polícia Militar mantém a operação de retirada de moradores. A Tropa de Choque invadiu a área na manhã deste domingo, dia 22, para cumprir a ordem de reintegração determinada pela juíza da 6ª. Vara Cível de São José dos Campos, Márcia Loureiro.

Na operação, foram usados gás de efeito moral e balas de borracha para a retirada de moradores, que permanecem resistindo. Dois helicópteros estão sendo usado na operação.

A reintegração já havia sido suspensa pelo TRT na última sexta-feira, pelo Tribunal Regional Federal – 3ª. Região. A juíza Márcia Loureiro, entretanto, não reconheceu a liminar do TRF e manteve a ordem de reintegração.

Na operação de hoje, iniciada às 6h, a PM usou de violência contra os moradores que resistiram à ordem de despejo. Um homem foi baleado e está internado em estado grave no Pronto Socorro Municipal da Vila Industrial.

Moradores de bairros vizinhos ao Pinheirinho também se revoltaram contra a invasão da Tropa de Choque à Ocupação e entraram em enfrentamento contra a Guarda Civil, que está apoiando a Polícia Militar. A cerca do Centro Poliesportivo do Campo dos Alemães, preparado para abrigar os moradores após a reintegração de posse, foi derrubada.

Histórico

A Ocupação Pinheirinho existe há oito anos (a serem completados em fevereiro) e abriga cerca de 9 mil moradores. Sem qualquer ajuda do Estado, os sem-teto construíram suas casas (a maioria de alvenaria), comércio, igrejas, abriram ruas, praça e criaram uma associação de moradores.

Desde o início da Ocupação, motivada pela falta de uma política habitacional da Prefeitura, os moradores tentaram abrir diálogo com o prefeito Eduardo Cury (PSDB), mas ele sempre resistiu em regularizar a área.

Recentemente, os governos federal e estadual já haviam se manifestado no sentido de assinar um protocolo de intenções para regularização do Pinheirinho, mas o prefeito, mais uma vez, se omitiu e até agora não demonstrou interesse em assinar o documento. A regularização não iria gerar qualquer custo para o município.

A área do Pinheirinho é de propriedade da massa falida da Selecta S/A, do especulador financeiro Naji Nahas. O local ficou abandonado por 30 anos, sem cumprir qualquer função social. Hoje serve de moradia para os sem-teto.
 
Fonte: SINDMETALSJC

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Greve Geral paralisa a Nigéria

Por Américo Gomes 

A Nigéria parou neste início de 2012, com uma Greve Geral contra a eliminação do subsídio de combustível, no dia 1° de janeiro.

Este ato do governo levou o preço do litro da gasolina de $ 0,40 de dólar para $ 0,86. Outras nações produtoras de petróleo como a Venezuela, Kuwait e Arábia Saudita oferecem a sua população combustível por cerca de $ 0.12 de dólar o galão, que tem em média 3,7 litros. (Nada a ver com o valor no Brasil de $ 1,40 dólar o litro)

Este aumento leva a patamares insuportáveis o preço dos transportes e alimentação para a maioria da população.

O presidente Goodluck Jonathan disse que o subsídio era economicamente insustentável, mas o que é insustentável é a maioria dos nigerianos viverem com menos de 1,3 dólares por dia, ou seja, 2 reais.

Lojas, escritórios, escolas e postos de gasolina em todo o país fecharam desde o primeiro dia desta Greve que os sindicatos dizem que vai continuar por tempo indeterminado.

Na cidade portuária Lagos, com mais de 10 milhões de pessoas, 500 mil se reuniram no Parque Gawi Fawehinmi. Em Kano, manifestantes bloquearam as estradas principais, fecharam postos de gasolina e cercaram a casa do chefe do banco central de Nigéria. Renomearam a praça principal da cidade de "Liberation Square," inspirando-se a revolução egípcia e na Tahrir Square.

As forças de segurança responderam aos protestos com violência. Em Kano, a polícia disparou e pelo menos três manifestantes morreram e pelo menos 30 ficaram feridos. Outro manifestante morreu em um confronto com a polícia em Lagos. O governo impôs um toque de recolher noturno, mas a população não acatou.

O momento do corte seria o mais inadequado para o governo que leva uma luta contra militantes islâmicos da organização Boko Haram, no norte do país. No que ele anuncia como um conflito pior do que a guerra civil que viveu o país na década de 1960, com os separatistas da República de Biafra.

Então por que fazê-lo agora?

País do Petróleo

A BP afirmou que a África detém 127 bilhões de barris de petróleo inexplorados, quase dez por cento das reservas mundiais. A Nigéria é o maior exportador de petróleo da África. A Agência Internacional de Energia diz que a Nigéria detém 37 bilhões de barris de reservas, superando a Noruega.

O governo anunciou com orgulho que o país hoje produz diariamente 2,4 milhões de barris. O Standard Bank estima que a Nigéria tem feito US$ 6 trilhões de dólares em receita do petróleo nos últimos 50 anos.

Mas apesar de ser um grande produtor de petróleo a Nigéria não tem investido na infra-estrutura necessária para produzir combustível refinado, então tem que importar grande parte de sua gasolina. Apesar de sua riqueza petrolífera, importa 85% do seu próprio combustível.

A partir daí o corte dos subsídios atinge o custo dos alimentos, e as necessidades básicas da vida, tais como aluguéis, mensalidades escolares e contas médicas.

Outra característica do país é que é considerado um dos mais corruptos do mundo. Desde a independência da Grã-Bretanha em 1960, cerca de US$ 400 bilhões das receitas do petróleo estão desaparecidos, presumivelmente roubados, pela elite militar e política.

Mesmo o salto repentino dos preços do petróleo causado pela Primeira Guerra do Golfo em 1990 e 1991, foi desperdiçado pela junta militar que governava o país e roubou uma “catarata de petróleo” que significou a entrada de $ 12,5 bilhões de dólares em receitas. Desviando bilhões dólares para contas privadas ou despesas clandestinas.

Lagos tem uma das maiores concentrações de bilionários da África. Enquanto a taxa de desemprego é de 47%, e a água potável é um luxo para cerca de 80% de sua população.

Multinacionais no comando

As exportações de petróleo e gás representam mais de 98% das receitas de exportação e cerca de 83% das receitas do governo federal. Os Estados Unidos é o maior importador de petróleo bruto da Nigéria, representando 40% do total das exportações.

Quase todas as reservas estão concentradas em torno do delta do rio Níger. O petróleo foi perfurado comercialmente em Oloibiri neste delta, em 1956, pela Shell gigante anglo-holandesa do petróleo.

A Shell admitiu ter derramando 14 mil toneladas de petróleo bruto nos córregos do delta do Níger, em 2009, destruindo parte das comunidades pesqueiras na região do sudeste da Nigéria e as zonas úmidas, no mais devastador derramamento de petróleo do mundo, que passava despercebido, com décadas de danos ao meio ambiente.

O delta do Niger é habitado por inúmeros grupos étnicos, e quase toda a região militarizada com a existência também de grupos de milícias, em constante conflito.

Atualmente quase toda a produção e exploração de petróleo realizada sob Joint Ventures entre corporações multinacionais estrangeiras e o governo federal através da Nigerian National Petroleum Corporation.

Há seis terminais de petróleo de exportação no país, todos estão nas mãos das multinacionais, a Shell possui dois. A Shell é responsável por 50% da produção total de petróleo do país, com mais de oitenta campos de petróleo. A Exxon-Mobil, é o segundo maior produtor, a Chevron a terceira, depois estão empresas como a Agip italiana, ConocoPhillips e a Total francesa.


Estas multinacionais ganham com a exportação e depois com a importação, pois a gasolina refinada vem de refinarias da Costa do Marfim, controladas pela Total francesa e da Holanda e Inglaterra, controladas pela Shell.

A mão do FMI

A hora do corte dos subsídios pode ter sido imprópria, mas a ordem veio diretamente do o recém nomeado diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde, que ordenou que os governos da Nigéria, Guiné, Camarões, Gana e Chade deveriam abrir mão dos subsídios aos combustíveis em seus países.

Com isso os preços dos transportes praticamente triplicaram nestes países, sem aviso prévio.

Esta foi uma exigência do Fundo antes de dar mais empréstimos do Banco Mundial, procedimento normal, já que sempre determina que os países mutuários devam seguir estritamente as políticas econômicas ditadas por ele, que incluem: desvalorização da moeda, elevação de tarifas de comércio, eliminação de subsídios e cortes no orçamento prejudicial à saúde do sector público e serviços de educação.

Junto com isso se concentrarem na produção e exportação de commodities e recursos para aumentar o câmbio. Com isso a inflação e a pobreza crescem na mesma proporção como visto em uma grande parte de países ao redor do mundo.

Como tantas outras nações, o povo nigeriano ter visto seu padrão de vida sistematicamente reduzido após serem submetidos a políticas estruturais de ajustamento do FMI. Desta vez o Fundo também exigiu a criação de um Fundo de Riqueza Soberana, similar ao criado pelo governo brasileiro.

Do outro lado o Departamento de Estado dos Estados Unidos, estão realizando exercícios militares com o AFRICOM, com cenário de guerra baseado na necessidade de assumir o controle do delta do Níger, em um contexto da “desintegração” da Nigéria à beira do colapso e em meio à guerra civil.

Seguindo os passos de Hillary Clinton, que em 2009, realizou reuniões com autoridades nigerianas para discutir novas medidas de segurança conjunta para o delta do Níger.

Além de controlar o delta, o governo dos EUA está estabelecendo uma "guerra ao terror" no norte do país contra o Boko Haram, para isso já enviou em novembro passado, 100 homens das Forças Especiais para trabalhar com os militares nigerianos. Ainda que não esteja claro que Boko Haram seja uma ameaça nas proporções que se anuncia.

As ações dos governos, das multinacionais e dos bancos internacionais demonstram quem de fato esta no comando na África e na Nigéria e o avanço no processo de recolonização.

Greve continua

A central sindical, Nigéria Labour Congress, estabeleceu um hiato nas manifestações neste fim de semana, para permitir que a população estocasse alimentos, gasolina e outros viveres. Anunciando que a greve continuaria na segunda-feira, 16 de janeiro.

Agora os sindicatos se preparavam para parar o “coração pulsante da economia” a produção de petróleo. O objetivo é parar da produção em todo o delta sul da Nigéria. Se os campos forem desligados, podem demorar seis meses a um ano para serem reiniciados.

A Associação do Pessoal Senior da Nigéria do Petróleo e Gás Natural, que representa cerca de 20.000 trabalhadores, disse que seria forçada a "aplicar uma opção amarga" com o encerramento da produção de petróleo e gás, se o governo recusar a repor os subsídios da gasolina.

A ameaça de uma greve causa nervosismo nos mercados mundiais de petróleo. A Nigéria é o quinto maior fornecedor de petróleo para os EUA e uma paralisação forçaria refinarias americanas a substituir 630 mil barris por dia de petróleo bruto.

Há informes também que como a Greve tem proporcionado a unidade entre a classe trabalhadora e os pobres nigerianos, a violência sectária tem sido condenada por muçulmanos e cristãos. Durante o primeiro dia da greve, os cristãos foram proteger os muçulmanos enquanto rezavam, e os muçulmanos se ofereceram para defender igrejas cristãs.

Esta Greve Geral na Nigéria é importantíssima, pois se trata do país mais populoso da África, com mais de 160 milhões de pessoas, quase o dobro de qualquer outro país no continente, e a segunda maior economia da África subsaariana. Coloca a classe trabalhadora e o operariado no centro de um dos maiores conflitos e um dos países mais importantes do continente.

Somente se a classe operária tomar os destinos de seus pais em suas mãos poderá acabar com séculos de exploração colonial feito pelas multinacionais e bancos dos países imperialistas.

Um ótimo exemplo a ser seguindo no restante da África e no Oriente Médio.


*Américo Gomes, advogado com especialização em Política e Relações Internacionais, membro do ILAESE e assessor do Sindipetro de Alagoas e Sergipe.

Fonte: Sítio do PSTU

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Com quantas crises se faz uma revolução?

 
Com a crise econômica, a “Primavera Árabe” e a Guerra Social na Europa, estamos vivendo as maiores transformações sociais desde a queda do Muro de Berlim, mas para que direção apontam estas mudanças?

Semelhante ao período da Queda do Muro de Berlim, uma mudança histórica se anuncia, embora o sentido e a dinâmica das transformações sejam ainda bastante incertos. Mas, diferente daquele período é no coração do capitalismo que está o epicentro da turbulência mundial. Estamos vivendo uma nova situação internacional caracterizada pela combinação de três tipos de crise: crise econômica global, crises políticas e crise do imperialismo.

Quem está em crise?

Quando se fala atualmente da crise econômica, do que exatamente está se falando? Depois de tantas idas e vindas, quais setores da economia efetivamente estão em crise? Crise econômica, grosso modo, é a interrupção do processo de acumulação do Capital, quando não se consegue obter lucro com os novos investimentos.

Com o início da crise imobiliária, em 2008, o setor bancário americano quebrou e levou consigo o mercado financeiro mundial. Neste momento, a crise se tornou global, atingindo todos os setores da economia e todos os países, resultando numa recessão econômica em 2009. O PIB dos países centrais (EUA, Japão e Zona do Euro) caiu para -3,5% e o PIB mundial também sofreu uma queda de -0,7%, só não sendo mais acentuada em função da manutenção do crescimento na China (9,2%) e Índia (6,8%), contrariando a tendência mundial.

Iniciou-se a pior crise econômica desde a depressão de 1929. Uma crise de superprodução agravada por uma brutal crise financeira. O início de um longo período de decadência da economia imperialista, que pode durar de 15 a 20 anos, e ser marcado por crises fortes e recuperações lentas, com uma ameaça sempre presente de uma nova depressão.

2010: suspiro da recuperação e regressão social

Em 2010, começou o suspiro, com os primeiros sinais de recuperação da atividade econômica. Mais uma vez, China e Índia ocuparam um papel de destaque, ambos crescendo cerca de 10%, acompanhados também pelo Brasil, que cresceu 7,5%. Embora com ritmo menor, os países centrais também recuperaram parte da atividade econômica, crescendo em média 3%, mesmo nível dos EUA e um pouco menor do que Alemanha (3,6%) e Japão (4,0%).

No caso da China, a manutenção do crescimento se deveu a incentivos públicos destinados à “burguesia costeira” (setores exportadores), investimentos em indústrias de aço e cimento e pressão pelo não cumprimento da Nova Lei do Trabalho, aprovada em 2007. No caso do Brasil, a retomada do PIB foi proporcionada pelo endividamento dos trabalhadores.

Foram nos países centrais, no entanto, que a situação se tornou mais grave e mais complexa. Nos EUA e na Zona do Euro, as empresas conseguiram inverter a dinâmica de queda de seus lucros. Dois aspectos são determinantes para compreender isso. No caso do mercado financeiro, o óbvio: os planos de salvamento aos bancos produziram a maior transferência de recursos públicos para o setor privado na história. Com eles, o mercado financeiro ganhou fôlego novo e, em 2010, o volume de ativos financeiros já era 10 trilhões de dólares a mais do que em 2007, ano anterior à crise (Instituto McKinsey. “Mapeamento do Mercado Global de Capitais”, agosto de 2011, p. 02).

Isso significa que, para além de casos particulares, o sistema financeiro como um todo precisou de apenas dois anos para recuperar as perdas (e ultrapassá-las) de uma das maiores crises econômicas da história. É claro que isso não é isento de contradições, pois uma recuperação tão acelerada das finanças ao mesmo tempo em que o crescimento econômico mundial ainda é letárgico, resulta em pressão por novas bolhas especulativas. Um sinal disso é que também voltou a crescer a relação entre capital financeiro e o PIB, atingindo 356%, no mundo, e 462% nos EUA.

A maior economia mundial e mais avançada tecnologicamente conseguiu aumentar seus lucros com um processo de regressão social. A participação dos salários no PIB do país reduziu cerca de 2% desde 2008, acentuando uma queda que ocorre desde os anos 2000. No setor produtivo, a retomada dos lucros não foi resultante de aumento dos investimentos em capital fixo (máquinas e equipamentos, que permitem aumentar a produtividade do trabalho); de fato, estes caíram -2,7% em 2009 nos EUA. Apesar disso, a “produtividade” do trabalho aumentou 3,5% no mesmo período, decorrente da intensificação das tarefas.

O desemprego, por sua vez, saltou de 5,8 para 9,6% entre 2008 e 2010, mas ele ficou ainda maior entre a população negra (de 10 para 16%), latinos (de 7,5 para 12,5%) e mães solteiras (de 8% para 12,3%), setores tradicionalmente marginalizados e uma das principais bases eleitorais do governo Obama. No caso europeu, a situação é semelhante: aumento do desemprego (de 7,6 para 10%), retração dos salários e inúmeros cortes sociais e de direitos trabalhistas. O diferencial é que, na Zona do Euro, está muito mais difícil administrar a dívida pública do que nos EUA. Em síntese, 2010 foi um ano de grande regressão social para a classe trabalhadora mundial, principalmente europeia e norte-americana. A taxa de desemprego levou esses países a se assemelharem a América Latina, o que possibilitou a leve recuperação de suas respectivas economias, quer por vias diretas (aumento da exploração do trabalho), quer por vias indiretas (endividamento público e redução da rede de proteção social).

Mas, mesmo com o crescimento na taxa de lucros, as grandes empresas não retomaram em grande escala os investimentos. O grau de ataque aos trabalhadores ainda está longe de ser o suficiente para garantir uma nova fase de crescimento do capitalismo.

Para abrir a perspectiva de uma saída da crise, o Capital assume uma guerra social contra o proletariado. O objetivo é acabar com o chamado “Estado de bem estar social”, ou seja, com as conquistas do proletariado dos países imperialistas desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Isso significa aproximar o nível de vida desses trabalhadores aos da América Latina. Como num efeito cascata, os latino-americanos seriam rebaixados aos níveis chineses; e os chineses a um nível ainda mais baixo. Junto com isso, a regressão de países imperialistas periféricos (como Grécia, Portugal e outros) para um status semicolonial.

A reação do capital para sair de sua crise aproxima o mundo de situações de barbárie. Parafraseando Lênin, essa é a catástrofe que nos ameaça.

2011: da regressão social às revoluções e à resistência

Felizmente, 2010 terminou mais cedo do que de costume, mais precisamente em 18 de dezembro. No dia seguinte, ocorreu na Tunísia, a primeira grande manifestação contra o desemprego e o aumento do custo de vida no país. O desenrolar dos acontecimentos instalou uma nova fase da crise, transformando-a em crise política.

No norte da África surgiram as primeiras grandes vitórias dos trabalhadores desde o início da crise econômica, com a derrubada de três governos aliados do imperialismo.

Em várias cidades do mundo surgiram praças Tahir e uma explosão de lutas sociais de todos os tipos varreu o mundo ocidental, aumentando a resistência da classe trabalhadora frente aos planos neoliberais. A Grécia viveu seguidas greves gerais, que se estenderam para Espanha, Portugal e Inglaterra. O movimento dos indignados expressou a radicalização da juventude, de largas camadas da classe média e do proletariado sem perspectivas de manter seu nível de vida. Ocuppy Wall Street marcou o início de mobilizações populares nos EUA e se transformou em “Ocupe os EUA”.

A reação dos trabalhadores e da juventude nublou ainda mais o panorama econômico. A necessidade de impor os planos econômicos de austeridade se transformou em crise política. E isso terminou por agravar a crise econômica: o ensaio de recuperação econômica foi substituído por sinais claros de uma nova recessão, a recuperação do mercado financeiro, pela retomada da instabilidade e a administração da dívida pública europeia não tem conseguido afastar a possibilidade de calotes.

Dilemas, perspectivas e desafios

Aos olhos do Capital, os dilemas para a crise atual são: a) retomar o crescimento econômico, b) estabilizar o sistema financeiro e c) administrar a dívida pública. A curto prazo, nenhum deles é possível.

O crescimento econômico nos países centrais não está sendo retomado porque a burguesia duvida de novos investimentos perante a crise política que se abre com as lutas dos trabalhadores. Os planos de austeridade também são em si mesmos, recessivos, por cortar em investimento público, salários e direitos.

Ou seja, as medidas que viabilizaram a leve recuperação em 2010 são as mesmas que estão causando a recessão atual. Não se trata de saber se a recessão irá começar no quarto trimestre de 2011, no primeiro de 2012 ou um pouco depois, mas qual a intensidade dela. A perspectiva para os próximos anos, caso se afirmem as políticas dos governos atuais, é de longas fases de baixo crescimento econômico, alternando com períodos de recessão, principalmente nos países centrais. E ainda segue aberta a possibilidade de uma nova depressão.

Vale lembrar que este cenário não significa imediatamente prejuízos para o Capital: ainda lhe resta apostar no mercado financeiro.

Novas turbulências financeiras

É justamente isto que os capitais têm feito: apostado na valorização dos ativos financeiros para garantir sua lucratividade. No entanto, como as finanças não criam riqueza nova, a valorização do capital financeiro depende da criação ou transferência constante de valor de outro setor. Antes da crise, os novos recursos foram garantidos pelo crescimento econômico e o endividamento público. Com a crise e a recessão, o endividamento público passou a cumprir este papel sozinho.

Os pacotes aos bancos não foram utilizados para abrir linhas de crédito para o setor produtivo. Estes recursos têm sido usados para aumentar ainda mais a especulação financeira, sempre com a possibilidade da formação de novas bolhas. Ou seja, as mesmas medidas que levaram à estabilização do mercado financeiro em 2010 contribuíram, junto com a crise da dívida pública, para as turbulências financeiras em 2011. Neste sentido, a perspectiva para 2012 é de aumento da instabilidade, com a possibilidade de formação novas crises financeiras e quebras de bancos na Zona do Euro e dos países europeus.

A cada vez que isso ocorrer, uma fuga de capitais para os investimentos considerados seguros vai provocar queda das bolsas no mundo todo, desvalorizando as ações das empresas e aprofundando ainda mais o quadro recessivo. Ironicamente, uma regulação do mercado financeiro limitando-se apenas a conter a especulação para evitar uma nova crise financeira, só iria antecipá-la. O primeiro país que quiser apenas regular o mercado financeiro ao invés de estatizá-lo, será o primeiro a sofrer com a fuga de capitais. O reformismo, que sempre foi apresentado como realista pela social-democracia, é a proposta mais utópica das que estão colocadas à mesa.

Com baixo crescimento econômico e sobreacumulação de capital, a estabilidade financeira na Europa em curto prazo só pode ser conseguida por uma estatização do sistema financeiro sem indenização. É claro que isto não interessa ao capital. Sendo assim, seus esforços não têm sido para superar a crise em curto prazo, mas administrá-la por meio do caráter rentista do Estado. Visivelmente, isso está agravando a crise.

Quais sãos as alternativas
?

Quando as grandes crises econômicas do Capital também se tornam grandes crises políticas dos governos e dos regimes burgueses, o confronto entre Capital e trabalho resulta em quatro tipos de saídas históricas: contra-revolução, reformas sociais, contra-reformas ou revoluções. A contra-revolução foi largamente utilizada, quer pelo nazi-fascismo na Europa a partir dos anos 1920, quer pelas ditaduras militares na América Latina durante quase todo o século 20. Ao invés de uma demonstração de força do poder burguês, ela denota a sua fraqueza, pois expressa a incapacidade de manter a dominação burguesa sem o recurso da repressão direta e sistemática às reivindicações dos trabalhadores e às suas organizações.

A implementação e expansão de reformas sociais foi a alternativa do Capital para sair da crise de 1929 nos EUA e conter a ameaça da revolução social no fim da Segunda Guerra Mundial. O período foi marcado pela hegemonia do capital industrial e pela criação do Estado de bem-estar social. Esta via de acumulação entrou em crise nos 1970 e as contra-reformas neoliberais se constituíram como sua alternativa que, por sua vez, também entraram em crise, na década passada.

Mudar as estações

Com a crise da dívida pública na Europa e a guerra social em curso, mais uma vez estamos diante de crises históricas. A sua solução não cabe mais nos salões estreitos das reuniões do G20, o seu desfecho será nas praças europeias. O projeto da burguesia já está desenhado: completar a privatização do Estado iniciada em 1980, aprofundando as contra-reformas neoliberais. Para salvar a Zona do Euro, o capital optou por sacrificar a sua periferia. É preciso atacar o Estado do bem-estar no conjunto da Europa, e não deixar qualquer resquício dele em países como Espanha, Grécia, Portugal e Irlanda. Existe a tendência de que esses países também tenham seu status imperialista rebaixado para semicolonial. Ao mesmo tempo, eles poderão se tornar um cinturão de exército de reserva que irá pressionar a classe trabalhadora dos países centrais a também aceitarem os pacotes de ajustes.

Mesmo que consiga aprovar os planos de austeridade, novos planos serão necessários. O ataque do Capital está apenas se iniciando, e não há garantia nenhuma na sua efetivação. A queda recente de vários governos é um termômetro do aumento da crise de dominação burguesa. Mesmo medidas simples da democracia burguesa que até ontem eram largamente utilizadas, como os plebiscitos, hoje têm o poder de colocar em risco a União Europeia. O próximo período pode levar a situações e crises revolucionárias em países imperialistas, o que não ocorria desde a revolução portuguesa de 1975. É a luta de classes que vai decidir o curso da crise econômica.

Como os revolucionários bem sabem, o que está em jogo é uma mudança histórica que será decidida nos próximos anos. Como a queda dos Estados do Leste Europeu colocou em cheque o socialismo, essa crise pode colocar de novo o embate capitalismo-socialismo na ordem do dia. O inverno dos europeus está chegando e promete ser rigoroso, mas as primaveras árabes decidiram ficar por mais um tempo. Como o mundo está realmente muito mudado, vamos ver que tem força para alterar as estações.
 
Escrito por Daniel Romero, do Ilaese 

Fonte: Sítio da LIT-QI